segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Caso Clínico: Esteatose Hepática

Paciente do sexo masculino, 49 anos de idade, é encaminhado à consulta externa de lipidologia (investigação, estudo e tratamento das dislipidemias). Ao realizar anamnese o médico verificou que o paciente tinha dislipidemia que é o aumento anormal da taxa de lipídios no sangue.  As dislipidemias podem ocorrer por causa do aumento de triglicérides (TGs) - (hipertrigliceridemia), aumento do colesterol - (hipercolesterolemia) ou por uma combinação das duas (dislipidemia mista). Dos antecedentes familiares salientava-se o fato de ambos os progenitores terem tido doença cerebrovascular e diabetes tipo 2.
Como antecedentes pessoais, trata-se de um doente obeso há já vários anos, com dislipidemia mista há cerca de 12 anos e com diabetes mellitus tipo 2 diagnosticada há cerca de um ano.
Referência a hábitos tabágicos (15 a 20 cigarros/dia) desde os 18 anos (com recente abandono dos mesmos) e hábitos etílicos de cerca de 20 g. de etanol por semana. O doente referia alimentação variada, sem cuidados dietéticos especiais, realizando apenas duas refeições diárias, em média.
Negava dor ou desconforto abdominal, bem como outra sintomatologia. Ao exame clínico, o doente apresentava obesidade (essencialmente central) com índice de massa corporal (IMC) de 34 Kg/m2 e com perímetro de cinta de 110 cm. Pele e mucosas coradas e hidratadas. Não eram evidentes xantomas, xantelasmas ou arco corneano. O restante dos exames objetivos não havia alterações de registo.
Do estudo laboratorial o paciente apresentava dislipidemia mista com redução do HDL; Apo B (apolipoproteína B é uma apolipoproteína primária da LDL, a qual é responsável pelo transporte do colesterol para os tecidos) aumentada; PAI-1 aumentado (inibidor do ativador de plasminogênio 1); hiperinsulinismo; função renal normal; função tiroideia normal; hemograma com leucograma e provas de coagulação normais. Apresentava também elevação persistente das enzimas hepáticos – TGP (120 U/L) e TGO (70 U/L).
Dada persistência destas alterações de enzimas hepáticas, foram realizadas sorologias para hepatites, que foram negativas. Foram também excluídas patologias metabólicas, nomeadamente a doença de Wilson e hemocromatose, pois os doseamentos de cobre, e saturação de transferrina eram, respectivamente, normais. Ao realizar ecografia abdominal verificou-se compatibiidade com esteatose hepática difusa. Perante estes resultados, realizou-se biópsia hepática que mostrou cirrose hepática micronodular com esteatose micro e macrovacuolar de intensidade moderada, com atividade inflamatória mínima.
Devido reduzida ingestão etílica (cerca de 20 g por semana) do doente e perante os resultados laboratoriais e histológicos, fez-se o diagnóstico de esteatose hepática não alcoólica com evolução para cirrose.





Discussão: 

Powell e os seus colaboradores propuseram os seguintes critérios diagnósticos para a EHNA:
1) Biopsia hepática com degeneração e inflamação, com ou sem corpos hialinos de Mallory, fibrose ou cirrose;
2) Evidência de baixo consumo de álcool (inferior a 40 g./semana);
3) Ausência de outras causas de hepatite (virusais, auto-imunes e outras)
A prevalência desta entidade na população geral não se encontra bem definida. A maioria dos casos ocorre nas 5ª e 6ª décadas de vida, com maior incidência em mulheres.
A Esteatose Hepática não alcoólica é uma doença que decorre de alterações no metabolismo de ácidos graxos nos tecidos não-adiposos e tem maior chance de ocorrer em obesos, diabéticos insulino-resistentes e dislipidêmicos. A patogênese dessa doença permanece pouco clara. Embora, sabe-se que a acumulação a nível hepático pode ocorrer devido ao aumento do aporte de ácidos graxos no fígado, a síntese excessiva de ácidos graxos pelo fígado, a diminuição da β-oxidação dos ácidos graxos e a redução da síntese de VLDL.
A maioria dos casos de EHNA é assintomática a apenas poucos pacientes apresentam dor e desconforto abdominal, principalmente crianças. Ao exame clínico se observa hepatomegalia sem evidências de doença hepática crônica. No exame laboratorial a EHNA pode ser caracterizada por algumas alterações como o aumento dos níveis de transaminases (TGP e TGO), o aumento dos valores de ferritina e a manutenção dos níveis de fosfatase alcalina, albumina e bilirrubina.
Algumas evidências experimentais indicam que a infiltração hepática por ácidos graxos aumenta a produção de tecido fibroso no fígado. Sendo assim, quase metade dos doentes poderão evoluir para fibrose e, em algumas séries, cerca de um sexto evolui para cirrose hepática.

Não existe terapêutica específica definitiva. Entretanto, estudos e ensaios clínicos estão sendo testados para a validação de medidas de tratamento. Por exemplo: o uso de antioxidantes, como a vitamina E, e o uso da metformina. Todas essas medidas de tratamento atuam na normalização das transaminases.

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